COMO SANTO ANTÓNIO LIVROU DA TENTAÇÃO A CERTA MULHER DE
SANTARÉM
No mesmo reino de
Portugal, em Santarém, nos tempos del-rei Dom Dinis, vivia certa mulher muito
pecadora, mas também muito devota de Santo António.
Apertava com ela o
demónio constantemente a induzi-la a que se matasse. E à pobre até lhe parecia
que o próprio Jesus Cristo lhe segredava ao Coração:
- Ò mesquinha, tantas maldades tens cometido que, só
matando-te, te poderás salvar!
E o demónio que
assim lá dentro a desinquietava com estas e semelhantes tentações, querendo
também vexá-la exteriormente apareceu-lhe em forma humana a falar:
— Eu sou aquele Senhor a quem tens ofendido gravemente, e
venho dizer-te que, se fores ao rio Tejo e nele te afogares em satisfação de
tuas culpas, todas te hei-de perdoar e te darei a eterna glória.
Ora, aconteceu que,
depois de o demónio muitas vezes lhe ter assim falado, o marido, num momento de
qualquer arrelia, chamou-lhe «mulher endemoninhada». Sanhuda por se ver
escarnecida, desceu em direção ao Tejo — era ao meio da manhã — na intenção de
nele se afogar conforme o demónio tantas vezes aconselhara.
Quando passou junto
á igreja dos Frades Menores, lembrou-se que era o dia da festa de Santo
António, e entrou a encomendar-se ao Santo. Prostrada diante de sua imagem,
toda em lágrimas fez sua oração:
— Ó meu Padre Santo António, bem sabeis quanto vos quero!
Valei-me nesta aflição. Sê benigno para comigo, e mostrai-me se apraz a DEUS que me vá no rio afogar ou se de todo em todo devo pôr
de lado tal ideia.
Quando assim
rezava, passou por ela um sono leve, e apareceu Santo António a falar-lhe:
— Levanta-te, filha, e guarda este bilhete. Com ele serás
livre dessa forte tentação.
E. acordando, viu a
mulher que tinha ao pescoço um pedaço de pergaminho, no qual, a letras de oiro,
estava escrito: « Eis a
Cruz do Senhor! Fugi, inimigos da alma, pois venceu o Leão da tribo de Judá,
raiz de David. Aleluia, Aleluia ».
E desde aquele
momento foi livre da tentação, e enquanto guardou consigo o bilhete ou breve,
nunca mais o demónio a apoquentou.
Soube do prodígio
el-rei Dom Dinis — pois o marido o divulgou — e pediu para si o milagroso
pergaminho. E o caso foi que, apenas sem ele, logo a pobre mulher começou outra
vez a ser tentada.
Compadeceu-se o
marido, e como já não podia haver o breve, que dele não se desfazia el-rei,
valeu-se dos Frades Menores que a Dom Dinis pediram uma cópia e a trouxeram. E
quando a entregaram à mulher, eis que ficou livre da tentação, como dantes
quando consigo trazia o breve primitivo. E confessou devotamente seus pecados
com lágrimas de contrição, e toda se converteu ao serviço do Senhor.
E por vinte anos
ainda viveu santamente, e em paz acabou seus dias.
E el-rei Dom Dinis
guardou o pergaminho original entre as suas relíquias que mais prezava, e com
ele, por intercessão de Santo António, muitos milagres se fizeram. Em louvor de
Cristo bendito. Ámen.
p. 43-45 DEVOTAS
ORAÇÕES EN HONRA E LOUVOR DE SANTO ANTÓNIO ( 49 paginas ).
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